Leonardo Ferreira Kaltner
(UFF)
O pensamento linguístico no Brasil quinhentista
O objetivo dessa apresentação é debater, a partir de uma perspectiva teórico-metodológica da Historiografia da Linguística (HL), as estratégias para se escrever uma história do pensamento linguístico do Brasil quinhentista. Esse debate teórico, a partir das obras de Konrad Koerner e Pierre Swiggers, buscará analisar como o contato linguístico entre colonizadores europeus e indígenas e a posterior política missionária de gramatização de uma língua de contato influíram na constituição de um pensamento linguístico no Brasil quinhentista. A obra Arte de gramática da língua mais usada na costa do Brasil (1595) de S. José de Anchieta, SJ (1534-1597) é a única obra escrita nesse contexto, que registra a gramatização latino-portuguesa do idioma dos Tupinambás, a língua utilizada no processo missionário e catequético. Analisaremos as influências da obra de Anchieta e a possível intertextualidade entre sua gramática e outras obras do século XVI, derivadas da tradição educacional do humanismo renascentista europeu. A gramática de Anchieta foi publicada com dezesseis capítulos, na tipografia de Coimbra, no ano de 1595, ainda que tenha sido escrita, provavelmente, entre 1554 e 1556, a partir do contato de Anchieta com indígenas e com intérpretes. Seu uso ao longo do século XVI pode ser atestado por documentação coeva, e foi sucedida pela gramática de Figueira, a Arte da língua brasílica, publicada em 1621. O pensamento linguístico de Anchieta deriva de uma época muito profícua no desenvolvimento do pensamento linguístico europeu, que é o período da educação humanística renascentista. Dessa forma, a intertextualidade com obras como as gramáticas de Antonio de Nebrija, João de Barros, Jan Van Spauter é uma das possibilidades de análise do pensamento linguístico predominante na colonização linguística da América portuguesa, no círculo intelectual dos primeiros missionários enviados à colônia. Sendo a intelectualidade dessa época vinculada à política missionária, o campo teórico da Linguística Missionária, desenvolvido por Otto Zwartjes, é auxiliar para a interpretação do documento gramatical escrito por Anchieta. Na gramática anchietana, há a utilização de metatermos gramaticais latino-portugueses, o que nos demonstra que o superstrato gramatical latino-português influiu na gramatização do idioma dos Tupinambás, como atesta a pesquisa de tupinólogos, como Aryon Rodrigues, e gramaticógrafos, como Ricardo Cavaliere. Os conceitos filológicos de superstrato e substrato se aplicariam na descrição linguística da América portuguesa quinhentista, tendo em vista ser o período inicial de implantação da língua vernacular europeia na sua colônia costeira. Esse aspecto será debatido em nossa apresentação, pois a colonização linguística pode ser problematizada sob um prisma ecolinguístico, conforme Swiggers, para se analisar a questão das línguas indígenas e africanas na constituição de uma sociedade multicultural e plurilíngue, marcada pela desigualdade social.
Autores: Leonardo Ferreira Kaltner e Melyssa Cardozo Silva dos Santos
Fernanda Kelly Mineiro
(UFOP)
Memória e tradição: estudo toponímico dos bairros mais antigos de Ouro Preto – MG
Neste trabalho, propomos um recorte da dissertação de Mestrado, em desenvolvimento no PosLetras/ICHS/UFOP, intitulada “Memória e Tradição: estudo toponímico dos bairros mais antigos de Ouro Preto – MG”. O recorte toponímico investigado compreendeu dez bairros ouro-pretanos nas perspectivas sincrônica e diacrônica, os quais serão analisados, classificados e serão apresentados em fichas lexicográficas, conforme o modelo proposto por DICK (1990). A antiga Vila Rica, fundada em 1711, situada na região central de Minas Gerais e uma das principais áreas do Ciclo do Ouro, foi a primeira Capital mineira, cujo nome foi alterado para Ouro Preto, em 1823. A cidade foi a primeira brasileira a receber o título de Patrimônio Mundial, conferido pela UNESCO em 1980. Sua população estimada é de 74.558 pessoas, de acordo com os dados do IBGE (2020). A Toponímia é concebida, no âmbito desta pesquisa, como um ramo da Onomástica que investiga os nomes próprios de lugares. Logo, um ramo dos estudos linguísticos mais especificamente dos estudos do léxico da língua. Ao considerar a interface entre língua, léxico, história, cultura e geografia, a Toponímia acaba por se configurar como uma disciplina com forte caráter interdisciplinar, dialogando com a cartografia, a história e a antropologia, entre outras áreas. Com a presente pesquisa, além de o objetivo de contribuir com parte do resgate da memória cultural do Município por meio do estudo toponímico de seus bairros, buscamos fomentar uma reflexão referente à motivação toponímica e sua importância para a sociedade, na medida em que o ato denominativo pode desvelar aspectos históricos, sociais e culturais de uma comunidade. Assim, conforme queremos ressaltar ao longo do texto, realizar este tipo de estudo pode instigar a importância da valorização do patrimônio local.
Josy Maria Alves de Souza
(UNIR)
Brilhantismo linguístico na estilização de nomes artísticos de drag queens
Este trabalho pretende investigar a estilização ortográfica e a influência estrangeira, especialmente da língua inglesa, em nomes artísticos de drag queens do Estado de Rondônia (continuando as pesquisas iniciadas em Souza (2019)). Trata-se de um estudo quali/quantitativo constituído, até o momento, de dez nomes artísticos de drag queens. As nossas hipóteses são que os nomes artísticos apresentam particularidades ortográficas em relação ao Português Brasileiro – PB e que artistas drag queens promovem estilizações ortográficas de seu nome e/ou optam por nomes com ortografia estrangeira, escolhendo nomes artísticos que acreditam ser atraentes ao seu público. A análise linguística terá fulcro em Amaral (2011), Camara Jr. (2011 [1973]), Cagliari (1999) e Massini-Cagliari (2011), o suporte antroponímico é baseado em Amaral (2008; 2011), Guérios (1981) e Oliver (2013) e as questões de funcionalidade de gênero serão apoiadas em Butler (2011; 2017) e Jesus (2012; 2015). Nossa análise parte da técnica da comutação, contrapondo os nomes artísticos aos seus correspondentes dicionarizados no Português Brasileiro, com vista a investigar as marcas linguísticas de estilização encontradas. Foram analisados pares opositivos, como Alécia/Alessia Gioia; Ariela Fernanda/Ariella Fernanda/; Ágata Vieira/Ágatha Vieira; Poti Paola Paloma/Potty Paolla Palloma, Paulete/Paulleth e Katy Bistteca (em que o nome comum “bisteca” assume característica de nome próprio). Nota-se que nomes artísticos podem fugir à ortografia padrão do Português Brasileiro, como CiBlack, Dunic, Katy Bistteca, Becky Ivy, Mathh. Os resultados preliminares deste estudo apontam uma forte tendência de estilização ortográfica e de influência estrangeira em nomes artísticos de artistas drag queens rondonienses. Observa-se, até o momento, que 50% dos nomes artísticos apresentam ortografia estilizada a partir de duplicação de grafema, como se observa em Alessia, Ariella, Potty Paolla Palloma e Katy Bistteca, inserção de grafemas como em Ágata/Ágata e troca de grafemas conforme se observa em Paulet(e)/Paullet(h). Aponta ainda que 50% dos nomes artísticos coletados até o momento sofrem influência de língua estrangeira, em especial nomes próprios emprestados ou inspirados, possivelmente, no inglês, conforme se revela com a forte presença de anglicismo na formação de nomes artísticos como CiBlack e Becky Ivy. Tais considerações sugerem que as artistas drag queens procuram originalidade na representação linguística do seu nome artístico, buscando atrair a atenção de seu público-alvo.
Autoras: Josy Maria Alves de Souza e Natália Cristine Prado
Maria Cleci Venturini
(UNICENTRO/UFPR)
“Museu Histórico” ou “Museu da Pátria”: implicações e atravessamentos dos nomes na narratividade museológica
Nossa proposta, nesse trabalho, é colocar em suspenso a narratividade museológica, a partir das tensões da memória em espaços museológicos, recortando para esta fala “O Museu Histórico de Entre Rios” – Guarapuava/PR. Para isso, mobilizamos a noção regime de historicidade, cunhada pelo historiador francês François Hartog (2003), tendo em conta a sua produtividade a partir do modo como é trabalhada na história, em que se articula com a experiência que tem como referente o passado, interpretado pelo presente com vistas a um possível devir e com a noção horizonte de expectativa, desenvolvida pelo historiador alemão Reinhart Koselleck. Para o historiador, o acontecimento inscreve-se em um tempo e em um espaço bem marcado e é a partir desses elementos que se realiza a interpretação, considerando-se que o sujeito ‘olha’ o seu objeto tendo como marco esse horizonte que determina e de certa forma circunscreve os movimentos de sentidos interditados ou permitidos. Na Análise de Discurso, a experiência funciona pelo retorno de memórias e de discursos que já circularam e significaram antes em outros lugares, instaurando efeitos, por vezes, de real/realidade e de verdade a partir de sujeitos, os quais constituem-se pela ilusão de que o dizer origina-se neles. Por essa ilusão apagam a interpelação ideológica e o atravessamento do inconsciente e, junto a esses apagamentos, apagam, também, a incompletude e a divisão dos sujeitos e dos sentidos abertos e não literais. A posição e a inscrição do sujeito em formações discursivas determinam e direcionam o discurso e a interpretação e isso ocorre a partir de lugares, que funcionam de modo muito similar ao horizonte de expectativa, direcionando o olhar/o ver/o crer. Desse modo, o discurso, mesmo o museológico, abre-se para diferentes leituras, tendo em conta a historicidade e o trajeto de leitura que está inscrito no museu pelas materialidades discursivas que o estruturam. A tese central de Pêcheux (1997) coloca a centralidade da ideologia e do sujeito para que o discurso se constitua. Em relação ao nosso objeto e ancorados na articulação construída por Hartog e Kosseleck empreendemos os necessários distanciamentos e deslocamentos, tomamos os discursos sobre os museus como lugar de memória, de acordo com Venturini (2009, p. 40) “como dispositivo que organiza a repetição e as lembranças do passado […] os esquecimentos, o que deve ser lembrado e o que deve ser esquecido, apagado”, instaurando a discursividade, mais precisamente pelo modo como o museu se contar/se diz/ se designa, a partir da memória, dos retornos, de atravessamentos e da historicidade, instaurando a narratividade museológica, pois “a materialidade do discurso, enquanto estrutura e acontecimento” (ORLANDI, 2017, p. 31). O Museu Histórico de Entre Rios significa como estrutura – em sua formulação – no intradiscurso a partir do que se vê/se lê e como acontecimento, colocamos em suspenso a tradução do nome do museu em alemão – Heimatmuseun – para o português como Museu Histórico, quando pode ser lido na língua alemã, como Museu da Pátria. Trata-se de dois nomes distintos, pois pela tradução “da pátria” por “histórico” fez irromper e trabalhar memórias, discursos, práticas sócio-histórico e culturais que sinalizam para duas pátrias: a nova (Brasil) e a velha (Suábia) e, também, duas línguas e seus dialetos: a portuguesa e a alemã. A questão que queremos responder a partir desse ‘equívoco’ é: quais materialidades significantes estruturam/compõem a narratividade/história/sentidos desse museu a partir dessa nomeação? Com isso, reafirmamos que museus, espaços memoriais e outros são narrativizados a partir de lugares/de filiações/de tomadas de posição.
Fernanda Silveira Pereira da Silva
(UNIR)
O livro didático como instrumento linguístico da libras: uma análise discursiva das orientações ao professor
O presente trabalho tem por objetivo compreender o funcionamento discursivo das orientações voltadas ao professor em livros didáticos de Língua Brasileira de Sinais (Libras), com base teórico-metodológica na vinculação, proposta por Eni Orlandi, entre as teorias da Análise de Discurso (AD) de Michel Pêcheux e a História das Ideias Linguísticas (HIL) fundamentada por Sylvain Auroux. Para esse fim, nosso corpus de análise é composto pela coleção de livros didáticos intitulada de Cadernos de apoio e aprendizagem: Libras, disponibilizada pela Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. Tal coleção está direcionada ao Ensino Fundamental I (1° ao 5° ano), e tem como finalidade contribuir para o trabalho docente visando à melhoria das aprendizagens dos alunos dentro da perspectiva bilíngue de educação de surdos. Segundo Auroux (2014), instrumentos linguísticos são produções de saberes sobre a língua, eles são pensados na perspectiva de suas funções instrumentais nas práticas linguísticas, ampliando a competência linguística do falante. É com esse olhar que trataremos os livros didáticos aqui, como instrumentos linguísticos, pois eles acomodam o modo como a língua se institucionaliza, como os sujeitos se constituem na/pela língua e suas relações sociais. E é no espaço escolar onde os instrumentos linguísticos mais se mostram nessa relação e nesse processo de institucionalização da língua.
Jorge Viana de Moraes
(USP)
Língua, cultura e civilização: um estudo das ideias linguísticas de Serafim da Silva Neto
Neste trabalho analiso o pensamento crítico do filólogo, linguista e romanista brasileiro Serafim da Silva Neto (1917-1960) sobre o português do Brasil. Para ele a língua era uma manifestação espiritual do homem, que estava atrelada à cultura e à civilização. Nosso objetivo é o de examinar, no discurso do filólogo: 1º. o que são para ele esses conceitos; 2º. qual a relação que Silva Neto estabelece entre eles; 3º. explicá-los à luz da história, do contexto em que o autor estava inserido. Para tanto, o corpus compõe-se de duas obras suas: “Introdução aos Estudos da Língua Portuguesa no Brasil”, de 1950 e “Língua, Cultura e Civilização”, de 1960. A análise é precedida da contextualização da época em que Silva Neto atuou, para que, assim, possamos estabelecer as bases teóricas sobre as quais está fundamentado seu pensamento teórico e crítico. Teoricamente, o trabalho é vinculado ao quadro da História das Ideias Linguísticas, já que visa a descrever e analisar como o autor desenvolveu seu pensamento crítico acerca do português do Brasil, principalmente com relação aos conceitos aqui mencionados: língua, cultura e civilização. Nesse sentido, seguiu-se a proposta teórico metodológica de Auroux (2006), para quem, ser um historiador da ciência é poder construir ligações causais e nas quais podem-se analisar o Horizonte de Retrospecção de um determinado autor.
Élcio Aloisio Fragoso
(UNIR)
Bethania Sampaio Corrêa Mariani
(UFF)
João Carlos Gomes
(UNIR)