Josie Helen Siman
(UNICAMP)
Conceptual Metaphors and beyond: an exploratory study of metaphor types and tasks
How do people interpret metaphors? To answer this question, we first need to acknowledge that there are different types of metaphors, different tasks, and different types of knowledge that might be available in different situations. In this exploratory study, we focus on three types of metaphors. Primary metaphors are also known as correlational metaphors, they are embodied and it is hypothesized that they are acquired very early in life when two basic experiences frequently co-occur. Complex metaphors are based both on primary metaphors and culturally shared knowledge – they tend to cover more abstract concepts. Both primary and complex metaphors are the focus of Conceptual Metaphor Theory. Attributive metaphors are more frequently studied in Psycholinguistics with the hypothesis that they are processed by categorization. We asked participants to answer a question requiring substitution of the metaphor vehicle for a word with a similar meaning and a question about the analogical motivation of the metaphor. These questions were posed considering three types of metaphors: primary (e.g., John is a cold person), complex (e.g., Life is a journey), and attributive (e.g., Robert is a lion), all presented in the A is B format, ten of each type (T= 30 metaphors). Participants had the option of leaving questions unanswered. Responses were coded considering their reference to conceptual metaphors, analogies (attributive or relational), metonymies, and other categories (T= 733 items coded). Attributive metaphors displayed higher amounts of analogical responses in the substitution task (A= 92) and almost no reference to conceptual metaphors (CM=4); complex metaphors displayed similar amounts of analogies (A=24) and conceptual metaphors (CM=31); and primary metaphors displayed the smallest amounts of analogy (A=12) and conceptual metaphors (CM=0). For the analogy task, analogical items were higher for the three types of metaphors, but the trend still goes from higher to lower numbers considering attributive (A= 74; CM=5), complex (A=56; CM=32), and primary (A=53; CM=0; Mt=14). Even though reference to analogy rates high for all metaphors, we can see that complex metaphors display more CMs, which might be explained by the fact that they are more abstract and (possibly) used in more diverse contexts. Attributive metaphors had higher amounts of responses (we suggest that these metaphors are less demanding than complex metaphors since the latter is more abstract). In regards to primary metaphors, which are often considered metonymies by linguists and disputed in psycholinguistics for being bidirectional, we highlight that responses made use of analogies with the external environment and internal (phenomenological) processes (that were not accounted for by previous studies). This shows that metaphors are not fixed; as our conceptual systems continue to develop throughout life, metaphors may acquire new meanings that will be active in different contexts. In this
Autores: Josie Helen Siman e Thiago Oliveira da Motta Sampaio
Marcos Cruz
(UFPA)
O ethos discursivo de virilidade na prostituição masculina: reflexões sobre interseccionalidade em duas cenas da prostituição analógica
Em um enquadre sociocultural que possibilita identidades inteligíveis, a prostituição localiza-se simultaneamente numa posição marginalizada, tornando abjetos os corpos-sujeitos que vivem nas práticas do sexo tarifado, e como elemento central na vivência de outros sujeitos. Embora a histórica condenação das relações amorosas e/ou sexuais tarifadas, a prostituição sempre esteve presente na estruturação social, configurando-se desde as relações analógicas, como nos templos gregos, nas ruas e nas saunas, até realizar-se por meio das interações digitais. Nesse espectro de personificação, a imagem social dos garotos de programa (GP) estrutura-se discursivamente pela necessidade de exercício da virilidade como condição de desejo, i.e., para que os corpos dos GP sejam apreendidos e desejados é preciso que mobilizem uma série de recursos corporais performativos, discursivamente projetados como símbolos da virilidade. Essa configuração de elementos, ao tempo em que se realiza, descortina as relações de poder que permeiam as relações econômicas do sexo tarifado, dos ideários de virilidade e das referências sobre o desejo. Logo, o corpo torna-se o meio e fim para a realização da virilidade, sendo realizada pela mobilização dos marcadores identitários, tais como raça, classe social, idade, entre outros. Contudo, a simples mobilização e materialização discursivo-performática desses elementos não garante sua exequibilidade exitosa na constituição do ethos de virilidade, havendo um exercício gradual da virilidade, que vacila ou não em alguns momentos. Esses momentos de gradualidade estão ligados aos efeitos de sentido que os marcadores identitários garantem ao GP, podendo favorecê-lo ou não na angariação de um cliente-em-potencial. Na esteira de Butler (2019a; 2019b) e Maingueneau (2015; 2020), Busco compreender como o exercício viril se realiza, pormenorizando duas cenas enunciativas da prostituição masculina analógica: (i) a primeira na prostituição nas ruas, cotejando como o corpo realiza os marcadores de classe e idade; (ii) a segunda nas saunas paulistanas, arrolando os sentidos sobre negritude na delimitação dos papéis entre GP e clientes. Ambas as cenas permitem ampliar o escopo de integibilidade da virilidade na prostituição masculina, observando o acirramento discursivo-performativo dos marcadores no exercício de uma imagem de si viril. Como perguntas, questiono: como os marcadores identitários são mobilizados para constituição estilisticamente corporificada da virilidade? Em que medida a interssecionalidade dos marcadores incide na efetividade do ethos discursivo de virilidade? Como resultados parciais, constato que a matriz de inteligibilidade da virilidade, condição para o GP tornar-se sujeito na prostituição masculina analógica, é sustentada pela articulação entre raça, classe, idade, evocando um imaginário binômico entre masculinidade/feminilidade, virilidade/efeminização, atividade/passividade, potência/debilidade sexual e riqueza/pobreza.
Mara Rubia Neves Costa Fanti
(PUC-SP)
O discurso feminista negro como instrumento de combate ao preconceito
Vários esportistas negros já foram alvo de injúria racial tanto em suas práticas esportivas como em programas de jornalismo destinados à cobertura desses eventos. Apesar da incorporação de mulheres atuando como comentaristas e repórteres nos programas de jornalismo esportivo, esportistas negras sofrem além do preconceito racial, o de gênero. Essas condições sócio-históricas motivaram nossa comunicação que objetiva examinar como as estratégias discursivas machista e racista se interligam e são combatidas pelo posicionamento feminista e em defesa da diversidade étnico-racial a partir do discurso materializado por meio do artigo Respeitem Serena Willians, produzido por Djamila Ribeiro, retirado da obra Quem tem Medo do Feminismo Negro? (2018). Para tanto, tomaremos como referencial teórico-metodológico a Análise do Discurso de linha francesa (AD) na perspectiva enunciativo-discursiva proposta por Maingueneau (2010,2018). Tendo em vista as condições de produção, assumimos o artigo como um discurso atópico e mobilizamos as categorias de interdiscurso, memória discursiva e código linguageiro. As análises que empreendemos revelam que apesar de grande parcela da população brasileira mostrar-se contrária à estratégia discursiva racista e machista, vários programas de jornalismo esportivo perpetuam esses posicionamentos, fomentando a necessidade da constituição de um discurso feminista negro para combater a expansão de uma cultura sexista e preconceituosa.
Luciane Lucyk
(UNEMAT)
O sujeito mulher do/no discurso imobiliário publicitário na região Norte de Mato Grosso: Ontem e hoje
O presente artigo realiza uma leitura do sujeito mulher veiculada na publicidade imobiliária da microrregião norte do estado de Mato Grosso – Brasil, na época de sua colonização na década de 1970 e na década atual 2020, que se coloca e articula distintas condições de produção, o sujeito e a memória como lugar de interpretação do discurso. O recorte da pesquisa se dá através de jornais, revistas e panfletos distribuídos na época da colonização da região norte como publicidade do empreendimento imobiliário, bem como publicidade atual com o objetivo de venda de bens imobiliários veiculadas nas mídias digitais. O objetivo é compreender, à luz dos pressupostos teórico-metodológicos da teoria da Análise do Discurso Materialista Francesa, o processo de constituição do sujeito mulher no espaço urbano (espaço como estrutura física, como um sistema de organização social e um conjunto de atitudes e ideias) em que os sujeitos significam a si mesmos e aos outros, na estrutura e acontecimento da linguagem que movimenta e significa o sujeito de direitos e deveres, ontem e hoje. Este trabalho é um recorte dos estudos iniciados no Projeto de pesquisa Questões Urbanas em Linguagem (QUEL), da Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEAMT, campus de SINOP-MT.
Mirlene Batista Sá
(PPGML/UNIR)
Respostas de empresas no site Reclame Aqui: uma análise do ethos discursivo
Em todo ato de enunciação há a construção de imagens, representações socialmente construídas e avaliadas pelo destinatário do discurso. Nos estudos retóricos, a imagem construída de si pelo discurso recebe o nome de ethos. O presente trabalho tem como objetivo analisar a construção do ethos empresarial considerando o discurso apresentado em tratativas a reclamações sobre serviços e produtos no site Reclame Aqui, a partir dos pressupostos teóricos da Análise do Discurso de linha francesa e do ethos discursivo teorizado por Dominique Maingueneau. A noção de ethos apresentada por Maingueneau busca refletir sobre o processo de adesão do discurso pelos sujeitos considerando a posição enunciativa em uma cena de enunciação. A cena de enunciação é formada por três cenas complementares entre si: cena englobante, cena genérica e cenografia, que corroboram para a construção do ethos. Os valores sócio-imaginários partilhados remetem a um mundo ético que engendram a figura do enunciador/fiador, sustentando-se em estereótipos para incorporação e adesão do ethos, que não pode ser apreendido fora de uma enunciação histórico e socialmente determinada. O ethos está vinculado à instância enunciativa, e para Maingueneau todo texto, seja ele escrito ou oral, apresenta uma voz, um modo de enunciar, que confere ao enunciador um tom, uma identidade que legitima o seu modo de dizer. Os atributos despertados pela enunciação não são necessariamente os atributos reais do locutor, mas sim o que enunciador utilizar para causar boa impressão de si. O corpus do presente trabalho é composto por discursos empresariais apresentados sob a forma de justificativa a reclamações recebidas e registradas no site Reclame Aqui. Por trabalhar no campo da afetividade e de produções semióticas, em que uma maneira de dizer implica uma maneira ser, o ethos nem sempre se constitui da forma que foi almejado. A análise do corpus do presente trabalho não cristaliza a representação criada pela empresa, mas contribui para refletir sobre a imagem que se produz em relação ao enunciador, bem como se as representações em questão auxiliam na construção da reputação almejada pela empresa.
Letícia Jovelina Storto
(PG-PUC-SP / UENP)
Diálogo e argumentação no ensino da oralidade por meio do gênero discursivo seminário
O trabalho com gêneros, orais e escritos, deve colaborar para a aprendizagem discente e para a sua atuação na sociedade como sujeitos ativos e com voz, haja vista que, para isso, são necessários o domínio da língua e o domínio dos gêneros discursivos (BAKHTIN, 2019). Ademais, o caráter dialógico e argumentativo da interação sócio-discursiva (BAKHTIN, 2019, 2015; VOLÓCHINOV, 2017) não deve ser ignorado nem diminuído no ensino de línguas, sejam elas maternas, naturais (como a Libras para os surdos) ou estrangeiras. Em seu ensino, o professor deve considerar o diálogo e a argumentação ao trabalhar com a leitura, a escrita, a oralidade e a análise linguística. Isso posto, o nosso objetivo neste trabalho é examinar como esses dois aspectos fundamentais da língua são tratados no trabalho com oralidade por meio do ensino do gênero discursivo seminário em livros didáticos de língua portuguesa do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental aprovados no Plano Nacional do Livro Didático – PNLD (2018). Como referencial teórico, fundamentamo-nos nas teorias de Bakhtin e do Círculo. Por isso, nosso lugar de fala é no interior da Análise Dialógica do Discurso (ADD). Para a realização desta pesquisa documental, empregamos o método indutivo, analisando qualitativamente os dados encontrados em um corpus composto de quatro coleções de materiais didáticos em um total de dezesseis livros. Os resultados mostraram que: a) os gêneros orais são pouco explorados nos materiais analisados; b) não há clareza quanto às características dialógicas e argumentativas da língua presentes no gênero seminário; c) as vozes de autoridade para o ensino da oralidade não estão demarcadas e praticamente inexistem na bibliografia das coleções; d) apesar de obras de Bakhtin e do Círculo serem apresentadas nas referências dos livros, a abordagem dialógica da língua é ignorada, posto que os materiais não consideram o outro para quem fala o aluno-seminarista, não o levando a considerar seu auditório e o contexto sócio-discursivo em que fala; e) os materiais não tratam do argumento de autoridade para o embasamento da fala discente em situação de apresentação oral via seminário. Concluímos que, no ensino da oralidade mediado por seminário em livros didáticos de língua portuguesa para o Ensino Fundamental II, o caráter dialógico e argumentativo da língua não é tratado, precisando o professor atentar-se a isso, acrescentando atividades e textos teóricos que deem conta de trabalhar esses aspectos com os estudantes, a fim de que eles não ignorem o outro, as vozes de autoridade e o contexto dialogal em que está inserido ao apresentar um seminário.
Autoras: Letícia Jovelina Storto e Beth Brait
Marcelo Travassos da Silva
(UNICAP)
Leitura crítica do texto visual de Superman vs. Muhammad Ali.
O primeiro super-herói do universo fictício das histórias em quadrinhos foi criado em 1938 nos Estados Unidos após a quebra da Bolsa de Valores de Nova York, em meio ao contexto de crise política, econômica e social na sociedade americana. Com roteiro escrito e desenhado por dois judeus, que o criaram, o texto visual de Superman traz nas entrelinhas intenções de seus produtores ao longo do tempo. Reconhecendo as narrativas com linguagem de quadrinho como um segmento do jornalismo moderno e que possui grande penetração social, este artigo tem como objetivo analisar o texto presente na publicação lançada em 1978, chamada Superman vs. Muhammad Ali. Através da análise crítica do discurso, utilizando o modelo tridimensional proposto por Norman Fairclough, este trabalho constrói uma interpretação diferente para essa aventura do Homem de Aço escrita na década de 1970, selecionando momentos importantes da história, divididos em sequências e quadros estáticos para analisar o discurso desse personagem fantástico. A partir disso, realizar uma leitura crítica da ficção, reconhecendo também diferentes aspectos culturais que fazem parte do texto visual de Superman. Dessa forma, identificar temas presentes nessa narrativa que se relacionam com a realidade social não apenas dos americanos, mas de vários países. A ficção pode não existir concretamente, mas o discurso desse super-herói é mais real do que se imagina. Além disso, cada vez mais atual. Se nos anos 30 o discurso propagado por Superman tinha a intenção de reforçar a ideia de supremacia dos Estados Unidos, ao mesmo tempo em que apresentava um bom exemplo a ser seguido, nos anos 70 esse personagem aborda temas como religião, política e preconceito.
Autores: Marcelo Travassos da Silva e Moab Duarte Acioli
Emanuel Fontel
(FALE/UFPA)
Crônicas e narrativas quilombolas: reinvenção do cotidiano e resistência
Crônicas e narrativas quilombolas: reinvenção do cotidiano e resistência
Emanuel da Silva Fontel (Professor Associado – FALE/UFPA)
Doutor em Estudos Linguísticos
emanuelfontel@hotmail.com
Benedita do Socorro Pinto Borges (Aluna de Doutorado – PPGL/UFPA)
benaborgestuc@gmail.com
RESUMO:
Uma definição recorrente e comum do gênero discursivo crônica é a que o caracteriza como um texto breve no qual se produz uma narrativa do cotidiano. Distanciando-se do problema de propor uma definição ou caracterização – talvez mais apropriadas – desse gênero, considerando o dinamismo de suas atuais funções nas várias esferas socioideológicas, nos diversos espaços socioculturais onde circula e nas diversas mídias e suportes que o veiculam atualmente, este trabalho apresenta parte dos resultados preliminares de um projeto de pesquisa denominado Estrutura Retórica de Crônicas Brasileiras e sua Aplicação no Ensino, em andamento na Universidade Federal do Pará. O referido projeto busca, entre outros objetivos, analisar e descrever a crônica brasileira, considerando, nesse processo, vários aspectos da textualização desse gênero. Os resultados aqui trazidos, de forma específica, dizem respeito a um desdobramento do projeto inicial no tocante ao contato intergenérico (MARCUSCHI, 2002) entre a crônica e as narrativas de enterro, coletadas em oito comunidades quilombolas do Baixo-Tocantins no estado Pará. Fernandes (2007) propôs uma estrutura narrativa peculiar para o gênero narrativas de enterro, praticadas na região pantaneira do Brasil. Borges (em andamento) e Borges et al. (2020) têm atestado a manutenção desse esquema formal nas narrativas quilombolas que ela examina em sua pesquisa de doutorado. Fontel (2019) propôs uma estrutura retórica característica para a crônica brasileira, considerando a incidência de esquemas prototípicos de relações retóricas, nos termos da Rhetorical Structure Theory ou RST (MANN; THOMPSON, 1988; MATTHIESSEN; THOMPSON, 1988). No que pesem as diferenças composicionais e superestruturais entre esses dois gêneros discursivos, alguns traços comuns claramente ligados à organização temática (BAKHTIN, 2011) os alcançam. Entre eles, um cotidiano (re)inventado (CERTEAU, 1980) por práticas discursivas que atendem, cada uma a seu modo, aos apelos da comunidade e aos objetivos sociodiscursivos que cada falante pretende alcançar. Têm em comum ainda a característica de pôr em pauta, de modo muito semelhante, o debate sobre a vida, sobre os jogos de poder, sobre os modos de construção da verdade – considerando aí o estatuto mítico das narrativas de enterro -b que interessam particularmente a cada grupo histórico, social e culturalmente estabelecido. Em outras palavras, pretende-se, por meio deste trabalho, não só apresentar os resultados da pesquisa em andamento, conforme delineado acima, mas também criar um espaço de interlocução que considere a dimensão criativa, inventiva (CERTEAU, 1980) e subversiva das práticas cotidianas reveladas nas narrativas de enterro das comunidades quilombolas, à semelhança do que as crônicas vêm há séculos propiciando às sociedades nas quais ela circula e onde é consumida culturalmente.
Palavras-chave: Crônica; Narrativa de enterro; Estética do Cotidiano; Reinvenção do cotidiano; Resistência
Autores: Emanuel Fontel e Benedita do Socorro Pinto Borges
Dora Savoldi da Rocha Azevedo
(USP)
Espaços narrativos e espaços sociais: O mito da Cobra-Canoa sob a perspectiva das integrações conceituais
Este trabalho é fruto de um projeto de Iniciação Científica realizado sob a orientação da professora Evani de Carvalho Viotti. A pesquisa se desenvolveu tomando como objeto o mito da Cobra-Canoa em sua versão tal qual contada pelo clã tukano Ye’Pârã-Oyé Põ’rã, do Alto Rio Negro. A narrativa é parcialmente compartilhada por outras etnias habitantes da região e conta a história de uma viagem realizada pelos ancestrais de cada um dos povos, ainda nos tempos míticos, durante a qual foram se diferenciando a partir dos instrumentos, objetos e canções ritualísticos que passaram a ter para si. Ao longo da narrativa, é determinado o local que será ocupado pelos ancestrais de tal ou qual grupo – à medida que descem da Cobra-Canoa –, bem como quem são as pessoas com quem podem estabelecer relações de casamento. Esses padrões, entre outros também concernentes à vida social de cada ancestral, são estendidos aos descendentes de tais ancestrais. Assim, os fatos narrativos relativos a uma personagem específica se ampliam, passando a abranger todo um grupo dentro da realidade da ecologia rio-negrina.
A análise que se buscou realizar observa os fatos narrados no mito da Cobra-Canoa à luz da teoria de espaços de integração mental (blended spaces). Assim, parte-se da premissa da existência de operações mentais – nomeadamente, integrações conceituais – que têm um papel crucial na capacidade humana de raciocínio, uma vez que permitem integrar domínios de diferentes ordens a fim de produzir informações inéditas que têm – ou não – um fim prático. Em termos do objeto desta pesquisa, então, pode-se pensar que as integrações conceituais foram necessárias para uma organização sociocultural do clã Ye’Pârã-Oyé Põ’rã, a partir da integração de fatos pertencentes a uma narrativa mitológica à disposição sociocultural do Alto Rio Negro. Tratou-se de analisar o mito ontológico da etnia Tukano, a fim de articular a realidade presente desse grupo aos eventos que sucedem narrativamente, em uma tentativa de compreender de que maneira os significados produzidos no mito se atualizam em uma esfera maior na ecologia do Alto Rio Negro. O argumento central é que os elementos contidos no mito produzem uma série de integrações mentais, ao se associarem aos grupos da referida região, que definem em grande medida como se dão as relações socioculturais nessa esfera. A partir disso, foi possível observar a força do mito da Cobra-Canoa no que concerne à criação e estabilização dos hábitos sociais e culturais parcialmente partilhados entre algumas das etnias rio-negrinas.
Marilene Aparecida Lemos
(UFFS)
Pandemia e “frontera cerrada”: entre limite(s) e deslimite(s)
Diante da declaração de pandemia de Covid-19 – doença causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2) – feita pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 11 de março de 2020, vários países adotaram medidas de prevenção com o objetivo de manter o foco em estratégias de contenção da circulação do vírus. Dentre estas medidas, está o fechamento de fronteiras terrestres. No caso da tríplice fronteira entre Dionísio Cerqueira (SC), Barracão (PR) e Bernardo de Irigoyen (Argentina) – que vem sendo objeto de minhas pesquisas – foram adotadas as seguintes medidas: no dia 15 de março, logo após a declaração da OMS, o governo argentino publicou um decreto que determinava o fechamento das fronteiras com os países limítrofes. Por sua vez, em 19 de março, o Brasil decretou o fechamento das fronteiras terrestres com 8 países (sendo que um desses bloqueios afetava Dionísio Cerqueira). Tendo em vista essas questões, este trabalho retoma os estudos empreendidos em minha tese de doutoramento defendida em 2019, no Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp, que visava compreender discursivamente a constituição do espaço de fronteira e de suas divisões. Assim, busco discutir, neste trabalho, a respeito do cotidiano da fronteira em tempos de pandemia e refletir sobre os efeitos de sentido produzidos no discurso a partir do fechamento da fronteira. Neste sentido, a partir do arcabouço teórico da Análise de Discurso e da História das Ideias Linguísticas (HIL), utilizo na análise enunciados de uma manifestação considerada pacífica em prol da reabertura da fronteira, realizada em 06 de novembro de 2020, organizada por empresários e comerciantes de Bernardo de Irigoyen. Na composição do corpus, diferentes materiais significantes são tomados, tais como: folder de divulgação e fotos da manifestação, comentários de internautas e entrevista com o prefeito de Bernardo de Irigoyen, Guillermo Fernández, produzida pelo Canal 6 Posadas. Para tanto, recorro, mais particularmente, às noções de saberes linguísticos cotidianos e políticas linguísticas ordinárias formuladas por Ferreira (2020). São também importantes, neste estudo, os conceitos de língua imaginária e língua fluida – propostos por Orlandi (2008); e de espaço imaginário de fronteira em confronto com o espaço fluido, conforme distinção de Rodríguez-Alcalá (2018). Sendo assim, através de enunciados associados a uma manifestação pela reabertura da fronteira, este trabalho traz reflexões acerca dos sentidos de divisão/fronteira e de integração que se (re)produzem no cotidiano da fronteira e colocam em circulação diferentes sentidos para o espaço e para os sujeitos que o habitam.
Ana Cleide Vieira Gomes Guimbal de Aquino
(ELOS / UFRA; LOBio / UFPA / USP; ACESIN / UFRJ)
Linguagem e padrão de produção discursiva em doenças de Alzheimer: uma revisão sistemática
O envelhecimento é um processo natural e gradual e às vezes provoca patologias com alterações cognitivas (Ribeiro & Guerreiro, 2002). As patologias neurodegenerativas, dentre elas a DA, produzem padrão discursivo típico que são evidenciados na avaliação neuropsicológica, principalmente relacionados à capacidade cognitiva e comprometimento da produção discursiva, em processos macro e microlinguísticos (Brandão, 2010). O objetivo desta pesquisa consiste na revisão sistemática, a partir da palavra PI[C]O para busca de estudos sobre a produção discursiva de sujeitos com DA em revistas eletrônicas e bases de dados como Scielo e PubMed, a partir dos descritores cognição, doença de Alzheimer e padrão discursivo, nos idiomas inglês, espanhol e francês. Como critérios de inclusão foram selecionados artigos que associam terapia farmacológica, terapia não-farmacológica e terapia de reabilitação comunicativa para verificar quais são os dados linguísticos e extralinguísticos encontrados em estudos sobre DA. A pesquisa foi registrada na Plataforma PROSPERO sob o número CRD42021219777. Dentre os principais achados linguísticos dos estudos estão o comprometimento da compreensão de palavras isoladas e de sentenças (Ortiz & Bertolucci, 2005) e a preservação de leitura (Moscovitch, Winocur, & McLachlan, 1986). Para os dados extralinguísticos dos estudos evidenciam-se o comprometimento da memória episódica (Allegri et al., 2001) e da memória autobiográfica (Dalla Barba & Rieu, 2001). A análise do discurso associada à avaliação neuropsicológica estabelece fatores pontuais entre as características discursivas e o funcionamento cognitivo e cerebral.
Autoras: Ana Cleide Vieira Gomes Guimbal de Aquino, Juliana Carvalho da Costa e Aline do Socorro Chaves Miranda de Oliveira
Lucas Martins Gama Khalil
(UNIR)
Ana Carolina Nunes da Cunha Vilela-Ardenghi
(UFMT)